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sábado, 28 de maio de 2011
Neurônios e materialismo dialético - Roberto Lent.
sexta-feira, 27 de maio de 2011
Pensar sobre pensar - Roberto Lent.
Acabamos decidindo alguma coisa, mas... Será que fizemos certo? Nesse processo, durante e após a tomada de decisão, refletimos sobre nosso próprio pensamento e avaliamos as nossas escolhas.
Pensamos sobre o nosso próprio pensamento: esta é uma propriedade da mente humana que os neurocientistas chamam de metacognição.
O difícil é se, depois da sua resposta, alguém lhe perguntar que grau de certeza você tem sobre a escolha que fez. Você diria que tem 100% de certeza de que acertou?
Bem, se isso for parte de um experimento psicofísico para a identificação de contrastes, a primeira conclusão é que cada um tem uma sensibilidade visual diferente, e, portanto, fará sua escolha de acordo com essa característica sensorial que lhe é peculiar. A certeza (ou incerteza) do acerto variaria com o sistema visual de cada um. Portanto, para investigar a incerteza decisória, é preciso eliminar a incerteza sensorial.
Para esse fim, o experimentador pode regular a dificuldade do teste manipulando os segmentos contrastantes (conhecidos como linhas de Gábor). Isso é possível, já que eles são gerados por funções matemáticas senoidais conhecidas. Dependendo dos parâmetros utilizados, as linhas podem ter diferentes contrastes, construídos ao bel-prazer do experimentador.
A vantagem desse procedimento é que se torna possível manipular as linhas apresentadas a cada sujeito, de maneira que todos tenham a mesma chance de acertar: por exemplo, 70% de respostas corretas. Assim, todos estarão em igualdade de condições, de acordo com a individualidade do seu sistema visual.
Decisões e autoconfiança
Agora, já que a percentagem de acertos sobre o contraste das linhas de Gábor se tornou constante para todos os observadores (confira os triângulos azuis no gráfico acima), pode-se testar o grau de certeza de cada um sobre a sua escolha (os losangos vermelhos do gráfico), independente da sensibilidade visual individual.Esse experimento foi feito recentemente por um grupo de pesquisadores liderado por Stephen Fleming, do University College London, na Inglaterra. O resultado, publicado este mês na Science, foi interessante, talvez bem conhecido dos psicólogos: alguns demonstraram muitas dúvidas sobre sua escolha, enquanto outros tinham absoluta certeza da mesma. A autoconfiança variou de 0 a 100% entre os indivíduos!
Autoconfiança tem a ver com a personalidade de cada um, e também com a capacidade de refletir sobre seus atos e analisar seus próprios pensamentos: reflete a tal metacognição que mencionamos acima. De fato, testando várias vezes os mesmos sujeitos, o grupo de pesquisadores constatou que a autoconfiança individual era bastante consistente – uma verdadeira ‘marca de personalidade’.
Stephen Fleming e seus colaboradores chegaram àquela conclusão famosa: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Ou seja: muitas de nossas decisões do dia a dia são tomadas sem que tenhamos grande certeza de que agimos certo. O desempenho comportamental é uma coisa, a autoconfiança sobre ele é outra!
A frenologia moderna
O grupo do University College London não ficou nisso. Perguntou-se se seria possível identificar as regiões cerebrais envolvidas com a metacognição. Trata-se de um empreendimento audacioso, que remonta aos frenologistas do século 18, a cuja história vale referir.Nessa época remota, o cérebro estava começando a vencer a disputa com o coração pelo direito de ‘sediar a alma’, ou seja, como o ‘locus’ estrutural das propriedades cognitivas e afetivas que todos possuímos. Especulava-se muito, no entanto, dada a falta de técnicas capazes de dar base científica ao problema.
Durante a vida do indivíduo, acreditava, algumas regiões se desenvolviam mais que outras, e acabavam por imprimir uma marca no crânio, identificável externamente por medidas craniométricas. A tese ficou conhecida como frenologia (do grego phrenos, mente; e logos, estudo).
Gall atirou no que viu, e acertou o que não viu. As funções que atribuía ao cérebro eram completamente especulativas, e a possibilidade de prever a nossa personalidade analisando as protuberâncias de nosso crânio não se confirmou. Para se ter uma ideia, a frenologia listava como funções mentais as seguintes: idealismo, espírito de imitação, combatividade, autoestima, destrutividade, e, até mesmo... republicanismo!
Apesar desse aspecto especulativo, o conceito de localização cerebral das capacidades cognitivas mostrou-se correto até hoje, confirmado pelos estudos com neuroimagem por ressonância magnética. Esses estudos partem da tese correta de Gall, segunda a qual as funções mentais são localizadas no cérebro, se não em regiões únicas restritas, certamente em redes neurais articuladas e conectadas funcionalmente.
As funções atribuídas ao cérebro no século 19, apesar de sua falta de base científica, estão de certa forma sendo resgatadas pelos experimentos controlados de hoje. Não soa ‘frenológico’ dizer que a autoconfiança possa estar localizada em uma certa região cerebral?
A localização cerebral da autoconfiança
Foi daí que partiram Fleming e seus colaboradores. Definiram quantitativamente a autoconfiança, que passaram a considerar uma expressão da metacognição – a capacidade introspectiva de avaliarmos mentalmente a certeza das nossas decisões e ações.Os mesmos sujeitos eram então levados a um exame de ressonância magnética capaz de medir o volume das diferentes áreas do cérebro (que presumivelmente reflete o número de neurônios) de cada um.
E, finalmente, um estudo de correlação estatística era realizado para comparar o grau de autoconfiança de cada indivíduo com o volume das áreas cerebrais.
O resultado foi uma correlação positiva do volume do córtex pré-frontal anterior, principalmente no hemisfério direito (as áreas identificadas com cores quentes na imagem), com a autoconfiança dos sujeitos. Aqueles com alto grau de autoconfiança apresentavam maior volume cerebral nessa região, e os inseguros exibiam menor volume.
É preciso exercer uma certa cautela ao interpretar resultados de correlação. Duas medidas podem estar correlacionadas, sem que necessariamente uma seja a causa da outra. No entanto, como as regiões apontadas no estudo são às vezes atingidas por lesões, e esses pacientes exibem sintomas depressivos com baixa autoestima, é inescapável a hipótese de que, neste caso, a presunção de causa-efeito possa ser verdadeira.
Além disso, não deixa de ser curioso que estejamos, em pleno século 21, a comprovar, por meios científicos controlados, que a especulação desenfreada dos frenologistas talvez não tenha sido tão absurda assim...
H.S. Terrace e L.H. Son (2009) Comparative metacognition. Current Opinion in Neurobiology, vol. 19, pp. 67-74.
S. Fleming e colaboradores (2010) Relating introspective accuracy to individual differences in brain structure. Science, vol. 329: pp. 1541-1543.
Roberto Lent
Instituto de Ciências Biomédicas
Universidade Federal do Rio de Janeiro
quarta-feira, 25 de maio de 2011
teoria e práticas
Nos anos 80 e 90, fiz muitos cursos e vivências de terapias/práticas corporais, inclusive do shiatsu. Sou super desajeitada, mas estranhamente (estranhíssimamente) na hora de praticar, "baixa" um santo do faz-tudo e eu acabei sendo em várias turmas às quais pertenci uma das melhores praticantes dos ditos cursos/vivências.
Reparo então o seguinte: nem sempre quem melhor "entende" (com a cabeça) é quem melhor pratica (com o corpo) este tipo de abordagem que tem o corpo como base. Ás vezes, com muita dedicação o tipo que chamarei de -"mental" consegue praticar direitinho, mas nem sempre. Nem tudo é explicável e sistematizável de forma a que quem tem mais tendência ao pensar consiga "executar" estas performances que têm o corpo como centro do assunto.
Mesmo na super teórica prática psicanalítica acontece algo semelhante: nem sempre o melhor estudante ou teórico é o melhor clínico. Ou seja: até mesmo um treco totalmente totalmente teórico- como é o caso da psicanálise- na prática exige aptidões que o indivíduo mais "mental" não consegue realizar com tanta eficiência quanto o que consegue na teoria.
O fato de estarmos estudando da forma como o estamos fazendo agora- lendo e conversando sobre, sem praticar nada- não pode ser uma faca de dois legumes? Não deveríamos associar um pouco a teoria à prática de maneira a "funcionarmos" melhor quando fôssemos clinicar?
Sem dúvida é preciso a base teórica para que as coisas tenham a dimensão teórica correta e para que todos possamos alcançar um patamar comum. Mas será que não seria interessante termos algum espaço para um papo prático de tudo o que estamos abordando?
Pelo que entendi, o papo mais prático começará lá adiante. Mas do jeito como entendo que estas coisas acontecem, talvez a prática devesse vir juntinho da teoria, até para que fôssemos sanando desde já os problemas que uma prática implica.
Acredito que isso implicasse em aumentar e/ou atrasar o curso. Sei lá. Eis aí minha meta-questão ;).
terça-feira, 24 de maio de 2011
Repressão e recalque. P. do prazer e P.da realidade.
sexta-feira, 20 de maio de 2011
FREUD SÓ PENSAVA “NAQUILO”?
Durante uma palestra minha, já faz tempo, alguém da platéia perguntou por que nós, Psiquiatras e Psicanalistas, só pensamos em violência e sexo quando, na vida, há outras coisas tão mais ricas e bonitas.
Não era a primeira vez que tal pergunta surgia. Por isso não fiquei surpreendido; estou acostumado com essa visão equivocada do que seja a Psicanálise.
Muita gente pensa que a Psicanálise nos enxerga como bichos, o que não é justo, pois ninguém formulou, sobre as emoções humanas, uma idéia tão romântica, lírica e poética quanto Freud.
A Psicanálise nos ensina que já nascemos apaixonados. Quando estamos nos braços de nossa mãe não é só proteção, alimentação, calor e abrigo o que buscamos. Queremos que ela nos dê leite e... deleite. Queremos dela alimento para o nosso corpo e para nossa mente. Caro leitor, somos seres emocionados desde o primeiro ao último suspiro de nossas vidas! Já nascemos enfeitiçados por este feitiço que é o amor.
Amor é correspondência, é sintonizar à emoção daqueles que amamos e ser por eles sintonizados na nossa emoção. Tudo no amor tem de ser mútuo; nada nos fascina tanto quanto cativarmos aqueles que nos seduziram.
Só que esse amor não é platônico, ou apenas incorpóreo. Ninguém nasce anjinho, sueco ou alemão. Em nossas artérias e veias pulsa o sangue quente da paixão (até rimou!).
Somos pessoas de carne e osso; almas encarnadas.
Na profundidade de nossas emoções não há atração de espíritos sem atração de corpos. Como não há atração de corpos sem atração de espíritos. A essência do amor é isso: um entusiasmo sensualizado, uma sensualidade entusiasmada. Ao estarmos enamorados buscamos um entrelaçamento de coração, cabeça, corpo e membros. Isso é o que Freud chama de sexualidade e não alguma animalidade no cio.
São energias que vibram e fazem vibrar nossa alma e nossos corpos. Não fossem essas energias em pouco tempo estaríamos todos mortos. São elas que garantem a continuidade da espécie, além – é claro – de garantirem todo o colorido da vida.
Toda timidez, angústia, depressão, etc. está intimamente ligada à percepção de que não somos, ou fomos, suficientemente amados... ou que representamos pouca coisa no coração dos outros... ou que perdemos algo ou alguém...
Os bem-amados possuem sempre um sólido sentimento de segurança e auto-estima.
O amor, desde que razoavelmente correspondido no seu leito principal, desde que não excessivamente bloqueado no seu fluxo original, inunda todo o universo. “Irriga as plantas, preocupa-se com as baleias, os golfinhos e todos os bichos em extinção, enfim, procupa-se com a natureza, gerando sentimentos ecológicos; inunda todos os povos, culturas e países, gerando os sentimentos de fraternidade e os ideais políticos; decola da terra e levanta vôo para o céu, gerando sentimentos religiosos. Porque o amor é a essência da própria vida”.
Portanto, caro leitor, isso é que é sexualidade para a Psicanálise. Só quando ferida é que gera a brutalidade, o estro sem afeto, a violência.
Agora pergunto: existe alguma idéia mais bonita, mais poética e mais romântica do que a idéia que a Psicanálise faz de todos nós?
Dr. Nei Guimarães Machado
Médico Psiquiatra.